São Paio


S. Pelágio ou Paio

Mártir

"Era S. Pelágio natural da Galiza. Pelágio, nome muito usado naquele tempo, por corrupção degenerou em Pelaio e Paio. Seu pai, homem rico, era irmão de Hermígio, bispo de Tuy nos princípios do século X.

A ocasião da sua vinda Córdova, que foi a do martírio, refere-se a um sacerdote dessa cidade chamado Raguel. Ensoberbecido, Abderraão III, rei emir de Córdova, quis assenhorar-se das restantes províncias da Espanha, habitadas pelos cristãos. Para tal fim chamou em seu auxílio, aí por volta do ano 920, os mouros de África.
Com um exército numeroso e bem equipado entrou por Castela no reino da Galiza, ao tempo em que D. Ordonho II, rei e Leão, o era também daquela província. Sabendo este religioso príncipe a determinação do orgulhoso agareno, e auxiliado por D. Garcia, rei de Navarra, e pelos Grandes e prelados de ambos os reinos, marchou a conter o ímpeto dos bárbaros. Encontraram-se as duas hostes. Voltaram os mouros a Córdova, vencedores e carregados de despojos. Entre os muitos cativos que levavam, ia Hermígio, bispo de Tuy, a quem puderam carregado de grilhões numa obscura masmorra. Tinha em Córdova alguns amigos, que angariou por ocasião da sua estada naquela cidade, donde transladou s relíquias de Santo Eulógio. Tratou, ao cabo de ano e meio, do seu resgate, oferecendo aos mouros as somas que quisessem pedir. E, para cumprimento da palavra, teve de deixar como refém o sobrinho Pelágio, menino de rara formosura e extraordinários talentos. O ilustre menino sofria resignado as durezas da prisão, não se queixando nem lamentando como os outros cativos. Escolheu para mestre a S. Paulo, lendo as suas cartas e meditando os seus trabalhos apostólicos.

Guardava tanta gravidade em todas as conversas que detinha os que se desmandavam e se, por acaso, os infiéis tratavam algum ponto de doutrina, confundia-os com a verdade da fé revelada. Não podia o inimigo da salvação ver com indiferença os progressos feitos por Pelágio na virtude e, por isso, quis perdê-lo.  

Um filho ou pajem de el-rei viu por acaso na prisão o menino cristão de rara formosura e, ponderando o caso a Abdemarrão, este o mandou vir imediatamente à sua presença. Ardendo este nos mais torpes desejos, fez-lhe grandes ofertas, procurando afastá-lo do amor a Jesus Cristo e à sua lei. Este respondeu: «Fica sabendo que tudo quanto me ofereces tem um fim mortal; não assim os bens que, sendo cristão, espero conseguir. Jamais negarei a meu Senhor Jesus Cristo, a quem adoro e confesso por verdadeiro Deus».

Pareceu a Abdemarrão que estas expressões nasciam de um coração pueril e, querendo acariciá-lo, tocou-lhe brandamente no rosto dizendo palavras aliciadoras. Mas Pelágio, revisto de um valor superior à idade, repeliu-o, dizendo: «Desvia-te; pensas acaso que eu sou algum dos teus efeminados lacaios?»

Fiou o rei a empresa a uns cortesãos lisonjeiro, os quais não omitiram meio algum de quantos podiam contribuir para perverter o nobilíssimo mancebo. Vendo Abdemarrão que era inflexível a resistência de Pelágio, trocou a sua amorosa paixão em raivosa cólera, mando imediatamente que, levantando-o do chão com umas tenazes de ferro, o deixassem cair muitas vezes e com grande crueldade, até que, ou negasse a Jesus Cristo, ou acabasse a vida nos tormentos. Arremeteram contra Pelágio os verdugos e começaram a fazer em seu corpo a carniçaria que aquele lobo ordenara.

Despedaçavam-no com algazarra, sem em seus rostos se ver sombra de piedade. Levantava o menino as mãos para o céu, pedindo a Deus fortaleza para consumar o sacrifício. Imediatamente lhas derribaram com o alfange. Outros lhe cortaram os braços, outros os pés, decapitando-o de seguida. Feito assim em pedaços, o lançaram ao rio Guadalquivir. Durou este glorioso combate desde as onze e meia da manhã às duas da tarde do dia 26 de Junho de 925, o qual foi domingo naquele ano. Foi assim despedaçado os 13 anos. O seu culto veio a tornar-se popular em Portugal". 

              (Santos de Cada Dia II, 2003:233)