A Solenidade de Todos os Santos abre-nos o espírito e
o coração às consequências da Ressurreição. O que se passou em Jesus
realizou-se também nos seus bem amados, os nossos antepassados na fé, e diz-nos
igualmente respeito: sob as folhas mortas, sob a pedra do túmulo, a vida
continua, misteriosa, para se revelar no Grande Dia, quando chegar o fim dos
tempos. Para Jesus, foi o terceiro dia; para os seus amigos, isso será mais tarde.
As “bem-aventuranças” deixam uma mensagem de esperança
e de alento para os pobres e débeis. Anunciam que Deus os ama e que está do
lado deles; confirmam que a libertação está a chegar e que a sua situação vai
mudar; asseguram que eles vivem já na dinâmica desse “Reino” onde vão encontrar
a felicidade e a vida plena.
Os “pobres em espírito” são aqueles que aceitam
renunciar, livremente, aos bens, ao próprio orgulho e autossuficiência, para se
colocarem, incondicionalmente, nas mãos de Deus, para servirem os irmãos e
partilharem tudo com eles.
Os “mansos” não são os fracos, os que suportam
passivamente as injustiças, os que se conformam com as violências orquestradas
pelos poderosos; mas são aqueles que recusam a violência, que são tolerantes e
pacíficos, embora sejam, muitas vezes, vítimas dos abusos e prepotências dos
injustos… A sua atitude pacífica e tolerante torná-los-á membros de pleno
direito do “Reino”.
Os “que choram” são aqueles que vivem na aflição, na
dor, no sofrimento provocados pela injustiça, pela miséria, pelo egoísmo; a
chegada do “Reino” vai fazer com que a sua triste situação se mude em
consolação e alegria…
Os “misericordiosos” são aqueles que têm um coração
capaz de se compadecer, de amar sem limites, que se deixam tocar pelos sofrimentos
e alegrias dos outros homens e mulheres, que são capazes de ir ao encontro dos
irmãos e estender-lhes a mão, mesmo quando eles falharam.
Os “puros de coração” são aqueles que têm um coração
honesto e leal, que não pactua com a duplicidade e o engano.
Os “que constroem a paz” são aqueles que se recusam a
aceitar que a violência e a lei do mais forte rejam as relações humanas; e são
aqueles que procuram ser – às vezes com o risco da própria vida – instrumentos
de reconciliação entre os homens.
Os “que são perseguidos por causa da justiça” são
aqueles que lutam pela instauração do “Reino” e são desautorizados, humilhados,
agredidos, marginalizados por parte daqueles que praticam a injustiça, que
fomentam a opressão, que constroem a morte… Jesus garante-lhes: o mal não vos
poderá vencer; e, no final do caminho, espera-vos o triunfo, a vida plena.
Liturgia da Palavra da Solenidade de Todos os Santos
I Leitura Ap 7, 2-4.9-14
«Vi
uma multidão imensa, que ninguém podia contar,
de
todas as nações, tribos, povos e línguas»
As
primeiras perseguições tinham feito cruéis destruições nas comunidades cristãs,
ainda tão jovens. Iriam estas comunidades desaparecer, acabadas de fundar? As
visões do profeta trazem uma mensagem de esperança nesta provação. A revelação
proclamada é a da vitória do Cordeiro. Que paradoxo! O próprio Cordeiro foi
imolado. Mas é o Cordeiro da Páscoa definitiva, o Ressuscitado. Ele transformou
o caminho de morte em caminho de vida para todos aqueles que O seguem, em
particular pelo martírio, e eles são numerosos; participam doravante ao seu
triunfo, numa festa eterna.
Salmo
Salmo
23 (24)
Esta é a geração dos que procuram o Senhor.
II
Leitura: 1
Jo 3, 1-3
«Veremos a Deus tal como Ele é»
Segunda mensagem de esperança. Ela responde às nossas
interrogações sobre o destino dos defuntos. Que vieram a ser? Como sabê-lo,
pois desapareceram dos nossos olhos? E nós próprios, que viremos a ser?
A resposta é uma dedução absolutamente lógica: se Deus, no
seu imenso amor, faz de nós seus filhos, não nos pode abandonar. Ora, em Jesus,
vemos já a que futuro nos conduz a pertença à família divina: seremos
semelhantes a Ele.
Aclamação
ao Evangelho Mt 11, 28
Vinde a Mim, vós todos os que andais cansados e oprimidos
e Eu vos aliviarei, diz o Senhor.
Evangelho Mt
5, 1-12a
«Alegrai-vos e exultai, porque é grande nos Céus a
vossa recompensa»
Reflexão
As
“bem-aventuranças” definem sempre uma alegria oferecida por Deus. Jesus
proclama “bem-aventurados” aqueles que estão numa situação de debilidade, de
pobreza, porque Deus está a ponto de instaurar o “Reino” e a situação destes
“pobres” vai mudar radicalmente; além disso, são “bem-aventurados” porque, na
sua fragilidade, debilidade e dependência, estão de espírito aberto e coração
disponível para acolher a proposta de salvação e libertação que Deus lhes
oferece em Jesus (a proposta do “Reino”).
Jesus
diz: “felizes os pobres em espírito”; o mundo diz: “felizes vós os que tendes
dinheiro – muito dinheiro – e sabeis usá-lo para comprar influências,
comodidade, poder, segurança, bem-estar, pois é o dinheiro que faz andar o
mundo e nos torna mais poderosos, mais livres e mais felizes”. Quem é,
realmente, feliz?
Jesus
diz: “felizes os mansos”; o mundo diz: “felizes vós os que respondeis na mesma
moeda quando vos provocam, que respondeis à violência com uma violência ainda
maior, pois só a linguagem da força é eficaz para lidar com a violência e a
injustiça”. Quem tem razão?
Jesus
diz: “felizes os sinceros de coração”; o mundo diz: “felizes vós quando sabeis
mentir e fingir para levar a água ao vosso moinho, pois a verdade e a
sinceridade destroem muitas carreiras e esperanças de sucesso”. Onde está a
verdade?